São Justino, mártir, autor de Apologia da Religião Cristã, também faz parte da lista de santos reencarnacionistas e sábios do cristianismo primitivo. Segundo ele, “a alma habita corpos sucessivos, perdendo a memória das vidas passadas” (16)
e na nota de rodapé:
(16)A Reencarnação e a Lei do Carma, pág. 46, William Walker Atkinson, Editora Pensamento, São Paulo, SP.
O livro de Atkison realmente tem essa frase na página referida, só que não dá indicação nenhuma de que obra de Justino ela saiu. O fio da meada estaria perdido, seu eu não a conhecesse de antes do livro de Geddes MacGregor, Reincarnation in Christianity, Ed. A Quest Book, cap. III:
According to de Dialogue with Trypho, he taught that human souls inhabit more than one body in the course of their earthly pilgrimage(13)
Que é quase uma versão inglesa do que traz Chaves. A nota 13 fornece:
Dial. IV P.G. 6, cols. 481-484.
Isto é: “Diálogo com Trifão, cap IV”. Bem finalmente alguma referência mais precisa. Encontrei outra fonte, agora online, que cita Justino
Near Death – Reincarnation and the Church
“E o que sofrem aqueles que são considerados indignos deste espetáculo?”, disse ele?
“Eles são aprisionados no corpo de certos animais selvagens e esta é a punição deles.”
Aliás, o portal Near Death é perito em fazer citações mutiladas, vide o link:
Modern Misrepresentation of Quotes by Origen
Por outro lado, Near Death fez a caridade de disponibilizar um link para Diálogos com Trifão: http://www.earlychristianwritings.com/text/justinmartyr-dialoguetrypho.html, que no cap. IV:
“(…) Responda-me, porém, a isto: a alma vê [Deus] enquanto no corpo, ou depois de ter sido retirada dele?”
“Enquanto na forma de um homem, é possível para ela”, continuei, “alcançar isto por meio da mente; mas especialmente quando ela foi posta livre do corpo e estando livre por si mesma, ganha posse do que estava habituada a amar contínua e plenamente.”
” Ela lembra disto [a visão de Deus], então, quando está novamente no homem?”
“Parece-me que não”, disse eu.
“Qual a vantagem, então, de eles terem visto[Deus]? Ou tem o homem que viu mais do que aquele que não viu, a menos que ele se lembre do fato que viu?”
“Não sei dizer”, respondi.
“E o que sofrem aqueles que são considerados indignos deste espetáculo?”, disse ele?
“Eles são aprisionados no corpo de certos animais selvagens e esta é a punição deles.”
“Sabem eles, então, que é por esta razão que eles se encontram em tais formas e que eles cometeram algum pecado?”
“Acho que não”
“Então este não colhem nenhuma vantagem de sua punição, ao que parece: além disso, eu diria que eles não estão sendo punidos a menos que tenham consciência do castigo.”
“De fato, não”
“Portanto as almas [ψυχαι] nem vêem Deus, nem transmigram de um corpo para outro, visto que elas saberiam porque estão sendo punidas e teriam depois medo de cometer mesmo o mais trivial pecado. Mas que elas percebem que Deus existe e que justiça e piedade são honrosas, eu também concordo contigo”, disse ele.
“Tens razão”, repliquei.
Justino (100 d.C? – 165), o Mártir, Diálogo com Trifão, cap IV.
Aí que está, em Diálogo…, do capitulo III ao VII, Justino narra a história de sua conversão ao cristianismo, graças a uma conversa que teve com um idoso cristão. Ao citar essa passagem, Gregor e Near Death (e, por tabela, J.R. Chaves) pegam palavras de quando, na altura da narrativa, Justino ainda era pagão e, portanto, crente em algum tipo de reencarnação. Você pode até achar os argumentos do veterano cristão fracos, visto que segundo o espiritismo certo inatismo persiste, mas não é o ponto aqui: houve um caso que anglófonos chamariam de misquotation: fragmentos escolhidos a dedo para serem usados como “prova” da opinião de certo autor, mas que no contexto original tinham um significado totalmente diferente. Este Pai da Igreja também é citado por Severino Celestino da Silva como alguém tido por defensor de “maneira limitada” da transmigração das almas (Analisando as Traduções Bíblicas, cap. XVII).
Para saber mais
– Mártir, Justino; Προς Τρυφωνα Ιουδιον Διαλογος, edição grega de Diálogos com o Judeus Trifão. Acessado em 10/08/2017.
_________________; Dialogue with Trypho, tradução em língua inglesa já de domínio público do portal Early Christian Writings, muito usada por autores anglófonos. Acessado em 10/08/2017
– Patrística, Padres Apostólicos, vol I, Paulus, 1995. Contém tradução para o português de Diálogos…